27 janeiro 2012

Sobre o amor



                                           "O beijo", 1907-8, de Gustav Klimt
O amor é do foro dos sentimentos, como tal a sua expressividade é limitada no campo da linguagem. Não por falta de tentativas do homem em fazê-lo, mas sim  devido às formas emotivas que pode tomar em cada caso particular. Este é o sentimento mais complexo que encontramos na nossa existência, sendo por isso o exercício de sua circunscrição, árduo e incompleto. 
Embora dado como sentimento, qualquer tipo de amor é uma relação do eu com um objecto. Qualquer objecto é possível de ser amado, desde que exista uma crença pessoal da existência de tal sentimento. No entanto salvaguardo que o ego pode enganar-se na classificação, pois a consciencialização de um sentimento é um acto lacunoso. Mas deve prevalecer a crença do indivíduo para aceitarmos o seu amor por algo ou alguém, mesmo podendo tratar-se apenas de desejo ou medo. Porque dessa crença errónea pode surgir amor, porque na génese amorosa existe sempre um móbil sentimental. Com esse móbil, o indivíduo envolve-se com o objecto amado e multiplica as formas de relacionamento, que o levará a um ponto de sincera submissão ao sentimento que se vincula ao objecto amado.
Tal como a amizade, o amor é um sentimento superior, porque para a sua existência tem de haver uma racionalização que gera crença, mesmo quando esta é inconsciente. O desejo como sentimento primitivo não sofre de tal regra, como tal, este urge e o amor relaciona-se. O tempo e as experiências com um objecto, tornam-se então fundamentais para a elevação da relação ao estádio amoroso. No entanto estes dois princípios podem existir exclusivamente no subjectivo, logo, tanto o tempo como as experiências, não podem ser considerados como relativas a estas ocorrências na realidade física. Exemplo disso é um amor platónico.
O tempo permite relacionar e as experiências classificar, num acto em que o ego as interioriza, alargando a quantidade de identificações entre o eu e o objecto amado, gerando um compromisso que estabiliza a relação. 
A submissão e o compromisso expressam o amadurecimento da relação ao estádio amoroso, em que o carácter destes dois valores na relação com o ego é o que vai definir o tipo de amor. A submissão no amor é sempre relativa ao sentimento e não ao objecto, o que permitirá realimentar este estádio complexo com novos estímulos e formação de novas ligações com o objecto, necessárias para formar-se complementaridade entre os dois. O ego passa a constituir-se progressivamente em relação ao objecto, não que se torne igual a ele, mas tomando-o como referencial. 

Como a submissão é ao sentimento, a relação amorosa não é perene, o que permite a sua degeneração quando as experiências com o objecto se alteram de modalidade, seja por culpa do ego, do objecto amado ou pela presença de outro objecto antagónico. O compromisso é o que vai tornar a relação amorosa mais resiliente, resultado de uma crença de continuidade focada no futuro. O indivíduo promove a formação de alternativas para encontrar soluções às adversidades, que contudo têm um limite, relativo às características do ego e contexto em que a relação existe. 
O amor como necessita de pelo menos uma consciência crente nesta relação, é também transcendente e com um elevado nível de dogmatismo que pode obscurantizar o próprio ego. Uma relação amorosa saudável promove uma porosidade que permita ao indivíduo experienciar a restante realidade, com a vantagem deste olhar exterior servir para enriquecer a relação e favorecer o crescimento dos dois. É com a negociação, disciplina e tolerância que a relação amorosa saudável contacta com o exterior, uma vez que é impraticável a formação de um amor que totalize o eu e toda a realidade. A negociação harmoniza a responsabilidade, a disciplina permite cumprir as regras estabelecidas e com a tolerância acessa-se à compreensão.
Tudo o que o amor permite justifica a sua complexidade e dificuldade em existir, transforma o indivíduo numa pessoa preenchida e substantiva. Ao amor de paixão dedico especial consideração, pois permite alguém desejar e sentir-se desejado, algo que em abstinência pode originar graves danos ao indivíduo. 
A minha crença pessoal para se conseguir uma relação amorosa conjugal de sucesso, passa por estimular a presença do desejo, da auto-estima, do carinho, da confiança, da convivência, da diversão, de ouvir e ser ouvido, de antecipar as necessidades do outro, de expressar o amor sentido, de tocar, de partilhar, da construção de um projecto, de se sentir à vontade no privado, de ser disponível, de beijar, de contemplar e nunca deixar de galantear. 

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